O paciente é obrigado a se submeter a tratamento de risco?

Em regra, ninguém é obrigado a se submeter a tratamento médico ou intervenção cirúrgica de risco, salvo na situação de risco iminente de morte.

O artigo 15 do Código Civil Brasileiro dispõe que ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.

No Estado de São Paulo a Lei Complementar nº 03, de 09 de março de 1995, que estabeleceu o Código de Saúde no Estado, prescreve em seu artigo 3º, que o estado de saúde expresso em qualidade de vida, pressupõe, entre outras coisas o reconhecimento e salvaguarda dos direitos do indivíduo, como sujeito das ações e dos serviços de assistência em saúde, possibilitando-lhe  decidir, livremente, sobre a aceitação ou recusa da prestação da assistência à saúde oferecida pelo Poder Público e pela sociedade, salvo nos casos de iminente perigo de vida.

No mesmo sentido tem a Lei Estadual nº 10.241/1999 que trata sobre os direitos dos usuários dos serviços e das ações de saúde no Estado. O artigo 2º, inciso VII da referida lei dispõe que são direitos dos usuários dos serviços de saúde no Estado de São Paulo consentir ou recusar, de forma livre, voluntária e esclarecida, com adequada informação, procedimentos diagnósticos ou terapêuticos a serem nele realizados.

Neste contexto, vale destacar, ainda, normas do Código de Ética Médica em vigor, instituído pela Resolução CFM Nº 1931/2009.

O capítulo IV do Código, que trata dos direitos humanos, especificamente no artigo 22, dispõe que é vedado ao médico deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado, salvo em caso de risco iminente de morte.

No capítulo V, no artigo 31, em regra semelhante, estabelece código que é vedado ao médico desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente risco de morte.

Pois bem, conforme se percebe pela legislação acima reproduzida, o paciente não pode ser constrangido a passar por um procedimento ou tratamento médico considerado de risco. Se isto acontecer, ainda que não haja erro médico, o profissional e o hospital poderão ser responsabilizados, no caso de lesão ou morte decorrente da intervenção médica.

A responsabilidade do médico, bem como do hospital, contudo, será afastada se o paciente estiver em iminente risco de morte, ou seja, mesmo na hipótese do paciente ou seu representante legal não ter consentido o procedimento e ou tratamento, em razão do paciente estar em iminente risco de morte, o médico poderá realizar o procedimento, que não será responsabilizado por eventuais danos (lesão ou morte) decorrente do procedimento, ressalvado, obviamente, a ocorrência de erro médico, devidamente comprovado.

Portanto, em não havendo iminente risco de morte, bem como a recusa no procedimento e ou tratamento proposto, mas o profissional, ainda assim realizá-lo e causar danos (lesão ou morte) ao paciente, haverá responsabilidade civil e criminal do médico (crime de constrangimento ilegal – art. 146 do Código Penal).   

A responsabilidade civil, isto é, indenização por danos morais e ou estéticos recairá sobre o profissional e em regra também sobre o hospital.

Por fim, deve ser destacado que o consentimento deve ser livre e esclarecido, ou seja, o paciente ou seu representante legal deve ter a plena consciência do tratamento/procedimento proposto, de todos os riscos envolvidos e dos possíveis resultados.

A orientação, inclusive para a proteção do próprio médico e instituição hospitalar, é que o consentimento seja feito por escrito contendo informações detalhadas e criteriosas no que diz respeito a tratamento, a riscos e a resultados a serem obtidos pelo paciente.

Não basta, portanto, o paciente ou seu represente legal assinar um termo genérico/padrão normalmente fornecido em internações, autorizando a realização de procedimentos ou tratamentos.

O consentimento dado de forma irregular, caracteriza o que chamamos de vício de consentimento e na prática não afasta a responsabilidade por eventuais danos sofridos pelo paciente em decorrência da ação médica, ou seja, o vício de consentimento tem o mesmo valor da recusa, uma vez que um dos direitos fundamentais do paciente é o direito à informação adequada.

 

Dr. Silas Muniz da Silva

11 Comentários

  1. Hêbe Gabani Neveshebe disse:

    Mto importante sabed obrigada

  2. MAXUEL disse:

    Com base nestas informações eu posso me recusar a tomar a vacina para Covid-19 haja vista ser uma vacina desenvolvida de forma emergencial e que teve várias etapas de pesquisa ignoradas.

    • Silas Muniz disse:

      Certamente sim, mas não estará livre das restrições impostas pelo Estado, tais como a proibição de visitar determinado país que eventualmente exija a comprovação da vacina.

  3. Pavlova disse:

    Existe alguma maneira da pessoa, legalmente, deixar registrado que, caso algo ocorra e a mesma venha a perder a sua capacidade de decisão, que não a mantenham ligada a aparelhos?

    • Silas Muniz disse:

      Sim, através do testamento vital, que é um documento no qual a pessoa determina quais os procedimentos médicos aos quais desejaria ou não ser submetida no caso de ser acometida de doença grave e/ou terminal, numa situação em que esteja incapacitada de tomar suas próprias decisões

    • Silas Muniz disse:

      Sim, através do testamento vital, que é um documento no qual a pessoa determina quais os procedimentos médicos aos quais desejaria ou não ser submetida no caso de ser acometida de doença grave e/ou terminal, numa situação em que esteja incapacitada de tomar suas próprias decisões

  4. Wallace Barbiere de Oliveira disse:

    Estou totalmente de acordo. Parabéns pelo artigo aqui publicado!
    Se os fabricantes de vacina não se responsabilizam pelos efeitos colaterais, é porque não teem certeza que não causará dano ou outro efeito maléfico ao paciente.
    Logo eu não me sinto seguro em me submeter a qualquer dessas vacinas emergenciais que não tiveram tempo hábil para testagem etc…

  5. Paulo Sérgio de Oliveira Moura disse:

    Quando eu fazia a faculdade de medicina, eu soube que a única espacialidade médica que tem obrigatoriedade com o resultado de um processo cirúrgico é a cirurgia plástica. Se isso procede, onde eu posso encontrar um artigo no Código de Ética Médica ou/e no Código Civil Brasileiro?

    • Silas Muniz disse:

      Paulo, o entendimento de que o cirurgião responde pelo resultado de uma cirurgia plástica, é uma construção jurisprudencial (dos Tribunais) e não existe um dispositivo legal expresso com essa previsão. Além do que, também não é um entendimento pacífico. Existe o entendimento, que mesmo na cirurgia plástica, o médico não deve ser responsabilizado, salvo se houver alguma falha na conduta médica (imperícia, imprudência ou negligência).

  6. Ana Paula dos Santos Alves disse:

    Tópico excelente e muito esclarecer Dr. Parabéns, é sucinto ainda assim muito bem embasado e de fácil entendimento, obrigada! Em tempos atuais de possíveis limitações de direito diante da pandemia, poderia fazer um novo texto ou atualizar esse? Seria de utilidade pública sem dúvida.

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